Começamos pelo segmento mais alto e de sotaque germânico, chamado também de SüdTirol

No último artigo, eu falei sobre o meu contato com os vinhos suíços em viagem, dificilmente disponíveis por aqui. Nessa mesma viagem, tive a oportunidade de conhecer de perto algumas regiões produtoras de vinhos do Norte da Itália. São regiões não tão famosas quanto alguns vizinhos (Piemonte e Veneto, por exemplo), mas que têm muito a oferecer, dentro de outro estilo de produção.

No mapa da Itália, que lembra uma bota, a porção Norte é a mais extensa horizontalmente – o topo da bota é mais largo de oeste a leste e depois o território vai se estreitando, de forma mais verticalizada até o sul. Sendo assim, temos uma área extensa, que compartilha latitudes semelhantes e que sofre influência de alguns elementos geográficos comuns. Dentre eles, de grande importância, é a presença dos Alpes, cadeia montanhosa alta e extensa que percorre a Europa, desde a França, a oeste, até a Hungria, a leste. A parte mais setentrional da Itália é em grande parte atravessada pelos Alpes italianos, que deixam suas marcas nos climas, solos e topografia dos vinhedos, impactando os perfis de vinhos das regiões. Minha visita recente se concentrou mais na porção Nordeste italiana, especialmente na região chamada de Trentino-Alto Adige, com uma breve passagem também por Franciacorta, na Lombardia.

Os Alpes nessa área são chamados de Dolomitas. Apesar de constar como uma só região vitivinícola, Trentino-Alto Adige pode ser desmembrado em dois segmentos, quando estudamos mais de perto suas características, já que Trentino fica um pouco ao sul e Alto Adige, mais ao Norte, fazendo fronteira com a Áustria e com Liechtenstein. O Alto-Adige também é chamado de Südtirol, nome alemão que remete ao seu histórico pertencimento ao Condado do Tirol, terra da Coroa do Império Austro-húngaro, anexada pela Itália após a Primeira Guerra Mundial.

Esse detalhe já dá uma direção diferenciada para as duas áreas, pois em Alto-Adige o italiano é falado, mas a língua mais forte é o alemão, enquanto em Trentino domina o italiano na língua e nos vinhos. Por outro lado, embora a região vitivinícola como um todo seja considerada a mais setentrional da Itália, os menos de 100 km que podem separar um vinhedo de Trentino de um vinhedo do Alto-Adige, mais ao Norte, podem dar origem a microclimas diferenciados, em função da altitude e da proximidade de fontes moderadoras do clima, como rios e lagos.

Vou começar, então, pela apresentação do Alto Adige, que tem aspectos comuns ao Trentino, mas algumas particularidades. Trata-se de uma pequena região no sopé dos Alpes, com reduzida superfície de vinhas, plantadas em terraços ao longo das encostas nos vales do Rio Adige. A região conta com grande amplitude térmica, o que favorece um amadurecimento balanceado das uvas. Os vinhos são predominantemente de clima frio, devido à altitude, isto é, predominam os brancos. No entanto, as Dolomitas criam uma barreira, que favorece uma boa estiagem no período da maturação, somando-se ao efeito moderador do Lago di Garda, ao sul. Vinhos com bom corpo, volume e forte expressão aromática, valorizados pela decisiva acidez e mineralidade salivantes.

As cepas presentes na Europa Central e Norte são comuns ali também e o sotaque germânico é típico. Riesling, Gewurztraminer, Sylvaner, Grüner Veltliner, Müller-Thurgau e a família Pinot (Pinot Bianco, Pinot Grigio, Pinot Nero) – estão todos lá. E não deixam a desejar em nada para os vizinhos. Há uma exclusividade para vinhos brancos, que é a cepa Kerner, resultante do cruzamento entre a Riesling e Schiava. A Schiava é uma uva tinta tradicional, plantada extensivamente na região, quando sob domínio austríaco, no século XIX. De perfil mais leve e pouco tânica, tornou-se uma tradição da produção local, especialmente das gerações anteriores. Hoje ainda assina parte dos rótulos tintos da região e bem trabalhada, pode surpreender.

Outra autóctone, de perfil oposto, é a Lagrein, grande sucesso da região, apesar da reduzida produção, já que só se adapta a certos territórios. A Lagrein produz vinhos escuros, concentrados, que normalmente demandam passagem por madeira para ficarem mais prontos. Com boa acidez, permanecem elegantes e certamente envelhecem muito bem. Há subáreas do Alto Adige que fazem mais sucesso em associação a certas variedades de uvas. É o caso da Tramin (Termeno em italiano), que muitos acreditam ser a região de origem da Gewurztraminer, o entorno do povoado de Egna para vinhos da Pinot Nero (Pinot Noir em italiano), o Valle Isarco e o Valle Venosta para brancos em geral. Tem ainda o Lagrein de Gries, no entorno de Bolzano, e o Schiava de Santa Magdalena.

Nos próximos artigos, continuarei apresentando a vitivinicultura de Trentino-Alto Adige, trazendo ainda detalhes sobre os produtores visitados.

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